Cidadãos passam a denunciar à CGU funcionários públicos que levam vida
luxuosa e incompatível com a renda. Ação se tornou possível após a divulgação
dos contracheques de quem trabalha para o Estado
A Lei de Acesso à Informação, que obriga os órgãos públicos a divulgar
na internet o salário dos servidores nominalmente, começa a apresentar
resultados positivos na fiscalização do quadro funcional. Com a possibilidade
de colegas de serviço e vizinhos ou parentes acessarem as remunerações, a
Controladoria-Geral da União (CGU), órgão do Poder Executivo federal
responsável pela disponibilização do contracheque de quase 1 milhão de
funcionários no Portal da Transparência, já recebe denúncias que apontam
enriquecimento ilícito de agentes públicos. São salários incompatíveis com a
vida regada a viagens, carros e casas de luxo. Com isso, caem por terra as
críticas, principalmente feitas pelos próprios servidores, de que a divulgação
nominal dos vencimentos apenas invade a vida privada e não resulta em qualquer benefício
à sociedade.
Revoltados com a vida que tais servidores levam em relação ao salário
que recebem, os cidadãos encaminharam as denúncias à CGU e esperam, agora, as
investigações do setor de inteligência da Controladoria para a comprovação do
crescimento patrimonial indevido. Em um delas, um servidor que ganha R$ 5 mil
chama a atenção por ter uma coleção de armas, motos e obras de arte de alto
valor. Em outro caso que chegou à CGU, um funcionário com salário de R$ 6 mil
faz frequentes viagens ao exterior e mora em uma casa confortável em um bairro
de classe média alta. Alguns dos servidores denunciados trabalham no setor de
licitações de órgão federal, mas, como a investigação corre em sigilo, os nomes
não são divulgados.
Para o ministro da CGU, Jorge Hage, a colaboração do cidadão ajuda
porque amplia a capacidade do órgão de identificar situações de
incompatibilidade. “É óbvio que nossos auditores sozinhos não podem acompanhar
eventuais sinais exteriores de riqueza de cada um desses quase 1 milhão de servidores.”
Segundo ele, é preciso apurar com rigor cada caso. Mesmo porque, nem todas as
denúncias são procedentes.
Hage lembra que as maiores dificuldades de apuração residem no fato de
que muitos investigados não colocam os bens no próprio nome, ou transferem
recursos para contas no exterior, o que torna difícil o rastreamento do
dinheiro. “Além disso, o procedimento de afastamento do sigilo bancário exige
que se tenha elementos suficientes para que a autoridade judicial se convença
em concedê-lo. No caso do sigilo fiscal, a CGU consegue os dados do servidor,
mas não tem acesso aos dos parentes. Novamente, para obter esses dados, seria
necessário autorização judicial”, explica Hage.
Sindicâncias
Nos últimos oito anos, a CGU instaurou 125 sindicâncias para apurar
enriquecimentos ilícitos por parte de servidores federais, sendo que 103 foram
concluídas. Sessenta e seis foram arquivadas, 13 encaminhadas para julgamento e
24 tiveram procedimento administrativo disciplinar. Dos 12 concluídos, cinco
servidores foram demitidos e sete, inocentados. Atualmente, 22 investigações
estão em curso na CGU.
O secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco,
acredita que a administração pública ainda enfrenta problemas burocráticos para
investigar e punir casos de irregularidades cometidas por servidores. Segundo
ele, era de se esperar mais punições diante de tantos escândalos que surgem no
país. “As dificuldades já começam na própria montagem da comissão que apura
administrativamente um caso de ilegalidade num órgão público. São raros os
funcionários que querem participar. Eles não ganham gratificação por isso e
ainda se desgastam com os colegas. Assim, o próprio processo já nasce com
vícios e brechas.”
"É óbvio que nossos auditores sozinhos não podem acompanhar
eventuais sinais exteriores de riqueza de cada um desses quase 1 milhão de
servidores”
Jorge Hage, ministro da CGU, defensor da colaboração do cidadão para
ajudar a identificar irregularidades no serviço público
O caminho da denúncia
» A denúncia pode ser anônima. É necessário somente a descrição mínima
dos fatos que indicam o enriquecimento ilícito do servidor.
» Caso o cidadão desconfie da evolução patrimonial incompatível com a
renda de um servidor público, ele pode fazer a denúncia à própria
Controladoria-Geral da União, no site www.cgu.gov.br ou por meio de
correspondência encaminhada ao endereço do órgão em Brasília (SAS, Qd. 01, Bl.
A, Ed. Darcy Ribeiro, Brasília/DF; CEP 70.070-905) ou ainda em uma das unidades
regionais da CGU nos estados.
» A denúncia é encaminhada à área responsável, que adota as medidas
necessárias para esclarecer a suposta irregularidade, com a análise da
documentação eventualmente encaminhada e dos fatos descritos. As suspeitas
apontadas podem ser analisadas pela Secretaria de Prevenção da Corrupção e
Informações Estratégicas. A Corregedoria-Geral da União também pode abrir um
procedimento de sindicância patrimonial. O objetivo é obter mais informações
que corroborem o enriquecimento ilícito do agente público.
» Havendo provas suficientes, é aberto o devido Processo
Administrativo Disciplinar contra o servidor, que pode ser demitido, já que o
enriquecimento ilícito é considerado um ato de improbidade administrativa.
Fonte: Correio Braziliense - www.osamigosdopresidentelula.blogspot.com.br/