A gestão eficiente tornou-se o mantra da vez na política brasileira.
Chegou-se a um ponto em que poucos políticos, da esquerda à direita, conseguem
articular um discurso sem mencionar a necessidade de aplicar no setor público
palavras e conceitos mais afeitos ao mundo da economia e da administração de
empresas. Só falta, em breve, os candidatos travarem debates na TV com
discussões acaloradas sobre que metodologia é a mais apropriada para tal ou
qual prefeitura ou governo do Estado, se o SWOT, o BSC, o GDP ou o PDCA.
Do ex-governador e senador mineiro Aécio Neves (PSDB), passando pelos
governadores de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), e do Rio de Janeiro, Sérgio
Cabral (PMDB), chegando ao prefeito Eduardo Paes (PMDB), do Rio, o número de
seguidores da aplicação de métodos de gestão da iniciativa privada ao setor
público não para de crescer. Virou bandeira tão suprapartidária que não é
difícil imaginar o dia em que um prefeito do PSOL contrate a Falconi ou a Ernst
& Young para ajudá-lo a governar Macapá, primeira capital conquistada pela
legenda neste ano.
O PT já ocupou o terreno, cioso em não perder espaço para siglas
adversárias. O estilo "mais gerencial, menos ideológico" é a marca de
uma geração de políticos emergentes. Recém-eleito para a Prefeitura de São
Paulo, o petista Fernando Haddad tem se mostrado um admirador do modelo. Em
seminário organizado pelo Valor, nesta semana, para um grupo de mais de 60
presidentes de grandes empresas, Haddad não defendeu apenas a absorção de
práticas da iniciativa privada, mas o "chamamento" de executivos e do
empresariado para que exerçam cargos públicos.
Numa provocação ao prefeito do Rio, presente ao evento, Haddad disse
que "chegou primeiro" ao convidar o ex-sócio da McKinsey, Marcos
Cruz, para ser seu secretário de Finanças, e que pretende se antecipar mais
vezes na busca por nomes do setor privado. Cruz foi indicado pelo empresário
Jorge Gerdau, fundador do Movimento Brasil Competitivo (MBC), que difunde a ideia
entre os políticos brasileiros.
O MBC é praticamente uma jabuticaba. Trata-se, como afirma seu
diretor-presidente, Erik Camarano, de um tipo de parceria público-privada (PPP)
que só existiria no Brasil e já tem atraído o interesse de entidades estrangeiras.
"Em 2010, no México, estive numa reunião de uma rede de monitoramento e
avaliação de programas públicos, com a presença do Banco Mundial e do BID, e
fiquei muito surpreso porque a gente constatou que não tem uma iniciativa
semelhante, que seja de patrocínio empresarial", conta Camarano. A partir
deste contato, o presidente do BID, Luis Alberto Moreno, sugeriu um acordo de
cooperação. E o modelo do MBC deve ser exportado, a partir de 2013, a começar
por países da América Latina, como Colômbia e Chile.
O MBC surgiu da cabeça de Jorge Gerdau, quando o empresário do setor
de siderurgia percebeu que não bastava ser competitivo "do portão da
fábrica para dentro". Sua cruzada é contra o custo-Brasil, que eleva os
preços dos produtos nacionais devido às deficiências de infraestrutura e da
alta carga tributária do país.
Criado em 2001, desde então o MBC mobiliza uma rede de 14 empresas de
consultoria e treina servidores públicos para que ajam à semelhança dos atores
privados e, com isso, busca alcançar a tão desejada competitividade do portão
da fábrica para fora.
É uma agenda do empresariado, que tem sido abraçada com entusiasmo
pelos políticos como decantação de um interesse nacional. O fato, porém, é que
há uma combinação de interesses. Os governantes ganham mais um instrumento para
melhorar sua própria competitividade no mercado eleitoral, e os empresários se
aproximam dos agentes públicos que podem lhe favorecer no mercado nacional e
global - a longo, médio ou curto prazo, nem sempre pela redução do custo-Brasil.
Para encurtar o tempo e dispensar licitação, as despesas com a consultoria são
necessariamente cotizadas pelos empresários dispostos a ajudar a prefeitura ou
o governo do Estado.
Expressão máxima da comunhão, o governo federal abriga, desde o ano
passado, a Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, com o
assento paritário de quatro ministros e quatro empresários, entre eles Jorge
Gerdau, que preside o comitê.
A PPP pela gestão eficiente já dura quase dez anos, transpassou os dois
mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas é com Dilma Rousseff,
de perfil mais tecnocrático, que se instala no seio da Presidência da
República.
Esvaziado o Conselhão da era Lula - que reunia empresários,
sindicatos, intelectuais e refletia uma maior heterogeneidade -, o papel de
traçar uma estratégia de desenvolvimento para o país recai na interação entre
alta burocracia e um círculo mais estreito de empresários.
Uma das maiores especialistas na relação entre empresariado e Estado,
a professora e pesquisadora da UFRJ, Eli Diniz, afirma que o modelo do MBC
representa um fenômeno novo e ainda pouco estudado. Não se trata, como no
regime militar, do que o então sociólogo e depois presidente Fernando Henrique
Cardoso denominou de "anéis burocráticos". Ou seja, com o Congresso
enfraquecido, a influência dos empresários se dava direta e principalmente em
torno da alta tecnocracia governamental, por meio de relações individuais,
informais e pessoais.
Com a redemocratização e a recuperação de poderes do Legislativo, a
marca tem sido a multiplicidade de formas de acesso do empresariado ao governo.
Na miríade de mecanismos, Eli Diniz cita o lobby altamente profissionalizado,
embora não regulamentado, no Congresso; a estrutura corporativista, com os
sindicatos patronais, como a Fiesp, de origem getulista; as associações de
caráter nacional, mas que não pertencem à arquitetura corporativista, como as
associações brasileiras de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) e da
Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee); e outras entidades influentes, como o
Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE) e o Instituto de Estudos para
o Desenvolvimento Industrial (Iedi). "Os empresários hoje têm vários meios
de ação e um sistema de representação muito diferenciado", afirma Diniz.
O MBC, e seu ideário da gestão eficiente, seria o mais novo deles.
Cristian Klein - Por Assis
Ribeiro - do Jornal Valor – Fonte Blog do nassif