Quem vê o senhor Pepe Mujica dirigindo o seu fusquinha 87 azul não
imagina que ele é simplesmente o presidente do Uruguai. Do salário de US$
12.500,00 que ganha pelo cargo público, ele doa 90% para ajudar na construção
de casas populares. Outra parte da sua renda vem do cultivo de flores e
hortaliças que faz com a sua esposa, a senadora Lucía Topolansky, sem
empregados, na pequena chácara que possuem.
O objetivo do casal é viver somente com aquilo do que realmente
precisa, já que mais posses também significam maiores custos de manutenção.
Essa é uma lição prática de gestão enxuta, ou como conhecemos no meio
corporativo "lean management". O princípio, além de reduzir custos,
viabiliza determinadas conquistas que para o casal são verdadeiramente
relevantes, como as vitórias políticas e econômicas em prol da população
uruguaia, à medida em que deixam certas preocupações de lado.
A questão é, diante da eficiência de uma vida mais simplificada, por
que as histórias como a do senhor Mujica causam estranheza, ou mesmo polêmica?
Visto de outra forma, por que ainda gastamos tanto dinheiro? Alguns aspectos do
nosso pensamento podem ajudar a esclarecer essa questão. Eles seguem abaixo.
O dinheiro como unidade de medida do ser humano
Os adventos da revolução industrial trouxeram consigo mudanças
significativas na forma como as pessoas entendem o meio à sua volta. A
principal delas talvez seja a nossa incapacidade de avaliar qualquer coisa fora
de uma perspectiva quantitativa, mesmo que de forma indireta. Ou seja, nossas
escolhas são orientadas sempre por quantidades, mesmo que de elementos
intangíveis como o quanto de satisfação ou de prazer esperamos sentir numa
alternativa.
No entanto, quando essas escolhas estão relacionadas a aceitar ou
rejeitar as pessoas do nosso convívio, pode ser difícil encontrar uma unidade
de medida coerente o bastante para definir o quanto bom ou o quanto importante
alguém é.
Tendo em vista a relevância do dinheiro na manutenção da vida, ele
acabou assumindo o papel de principal unidade de medida do ser humano. Através
dele, nós tendemos a estimar o valor das pessoas, e assim nos sentimos mais ou
menos aceitos, de acordo com o quanto somos capazes de demonstrar essa riqueza.
O que normalmente resulta no desejo de consumir para ostentar o poder
aquisitivo, evitando a rejeição dos demais.
O conceito de necessidade é flexível
O fato é que poucas coisas são verdadeiramente necessárias à
manutenção da qualidade de vida e quase todas elas poderiam ser compradas por
um custo muito menor. No entanto, somos capazes de estabelecer um conjunto de
valores e princípios para enviesar o modelo lógico com o qual fazemos as
escolhas. Trata-se de argumentos como "é uma festa importante e por isso
eu preciso ir com uma roupa nova"; "eu sempre quis comprar um desses
(para enfeitar o interior do guarda-roupas)"; ou o clássico "não, mas
eu realmente estava precisando disso (agora que eu vi na vitrine)". Enfim,
havendo o desejo, nós esquematizamos a necessidade.
O cérebro e o seu bolso
Há um grupo de estruturas cerebrais que juntas formam o chamado
sistema de recompensa. Através do fluxo de determinados hormônios nessa região,
o cérebro estimula o indivíduo a executar ações que ele acredita serem
necessárias à preservação da sua integridade física.
Esse mecanismo entende a sua aceitação em um determinado grupo social
como sendo um recurso de proteção, e pela sua segurança ele passa a estimular
as ações que deverão trazer o máximo possível desse benefício, de acordo com as
suas crenças, no caso, comprar mais significa ser mais aceito e por
consequência estar mais seguro.
De modo geral, fica clara a relação entre a necessidade de gastar e a
necessidade de ser aceito pelos demais. O que na prática não se justifica.
Precisamos dar um passo adiante na superação desse viés tão comum e procurar a
realização pessoal nas conquistas verdadeiramente capazes de beneficiar a nós e
ao maior número possível e pessoas, o que quem sabe, venha justamente de um uso
mais inteligente do nosso dinheiro.
Por Pedro Souza – www.administradores