Texto de Davis Sena
Filho
O injusto vai contra a ordem do que é
sensato, porque não pondera, do que é social, porque não é solidário, do que é
humano, porque não é humanista
O injusto é ingrato e egocêntrico; e a
injustiça é a mãe de todos os conflitos. Sem justiça não há paz. O injusto não
pondera, não percebe e não observa as ações e a conduta daquele com o qual
convive em seu lar ou fora dele, mesmo se este ente for generoso ou tolerante e
até mesmo, se o for o caso, avesso ao confronto pessoal ou em sociedade.
O injusto, além de ser ingrato, não
gosta de ninguém, e demonstra parte de sua face até então escondida em suas
entranhas e dessa forma dá publicidade ao outro lado de sua personalidade, que,
quando em conflito, em um momento demoníaco, suas palavras brotam como lava a
sair da boca de um vulcão, sem, contudo, preocupar-se com o outro, que naquele
momento se torna alvo de sua ira, do seu ódio e da sua falta de compreensão
sobre aqueles que estão ao seu lado.
O injusto vai contra a ordem do que é
sensato, porque não pondera, do que é social, porque não é solidário, do que é
humano, porque não é humanista. Ele detesta discernir sobre realidades e fatos,
porque se recusa, terminantemente, a pensar nele, nas suas falhas, nos seus
erros e nas suas injustiças. Afinal, ele é injusto; e se for se autoanalisar é
capaz de se considerar injustiçado. E o egocêntrico sempre acha que tem razão e
que nunca erra ou errará, o que, indubitavelmente, favorece muito a geração de
conflitos — desentendimentos.
Ele é egoísta, o que o torna
egocêntrico, porque tem o ego centrado em sua personalidade, em seu caráter, e
a ser assim não consegue compreender o que é justo do que é injusto, porque,
por ser injusto, somente ele sente dor, somente ele é injustiçado e somente ele
não é compreendido, em todas as questões relativas à sua vida, porque sempre,
em qualquer hipótese, o injusto se considera vítima e nunca vitima seu
semelhante. Jamais ele pensa que fez o papel de algoz, porque os outros que são
ruins, incompreensíveis e cruéis.
O pensador francês Jean-Paul Sartre
afirmou: "o inferno são os outros"! Jamais o injusto, dentro de sua
redoma de lógica doentia e bipolar, assumirá tal realidade tão bem esclarecida
por Sartre.
Por incrível que pareça, um dos
sentimentos do injusto é se sentir injustiçado, e, para isso, ele finge a dor
que não sente, por se tratar de um ator. Seu espírito está contaminado pelo
ódio e pelo desprezo às pessoas. Ele não gosta de ninguém, mas disfarça a
falsidade intrínseca ao seu caráter com gentilezas e maneirismos tão
superficiais quanto a uma casca de ferida.
O injusto nunca se sente à vontade em
sociedade e no lar e por isso faz pouco dos outros, agride a consciência, a
inteligência e a noção do que é correto ou errado, no que é relativo a uma
convivência fraternal e respeitosa entre as pessoas. Ele não sabe o que é
respeito e muito menos o que é fraternidade. Por ser assim e por se considerar
socialmente superior se torna nocivo àqueles que convivem com ele, que dependem
dele ou que são subordinados no âmbito do seu trabalho, da sua profissão.
O injusto comete injustiça também com as
pessoas que estão ao seu lado, que o protegem, que o amparam e o ajudam. Ele é
tão mesquinho de sentimentos e autoritário, e por isto injusto, que erra quando
está por cima ou quando está por baixo. Nada importa ao injusto, porque, para
ele, até mesmo sem ter plena consciência dessa razão, o universo é o centro do
seu ego. Por isso, a dificuldade de se analisar, de ponderar, de discernir, de
compreender e de reconhecer suas falhas, seus equívocos e suas injustiças.
Portanto, quem se sente injustiçado pelo
injusto não tem como fazê-lo entender, porque ele não erra, e, se não erra, não
tem como ele conhecer o sentimento da humildade para pedir perdão e,
conseqüentemente, reconciliar-se com o ofendido, com o injustiçado. O injusto é
a própria patologia. Quando se olha no espelho, enxerga a imagem da
perversidade, que, às vezes, ele detesta, até a reconhece, mas seu instinto,
sua essência e seu caráter não conseguem se livrar de tal aspecto no que tange
à vilania.
Para o injusto detestar, desprezar,
desrespeitar alguém não foi e não é necessário que este ente humano tenha feito
mal a ele. O injusto se torna seu inimigo e o insulta porque, dentro de sua
lógica, a insanidade se torna normalidade, e por isso ele não tem sentimento de
culpa, de modéstia, de perdão ou humildade.
O injusto não serve, somente quer ser
servido, e, se servir ou fazer qualquer favorzinho, sente-se explorado, porque
está acostumado a receber e nunca dar, bem como, na primeira oportunidade que
tiver, joga na cara e cobra o favor que fez. O injusto detesta a oração de São
Francisco de Assis, que ensina que "é dando que se recebe" e que
"é perdoando que se é perdoado". Isto está fora de cogitação.
O injusto quando entra em conflito te
acusa, inverte situações, fatos e verdades, tergiversa sobre as realidades e
faz seu oponente sofrer, ainda mais quando o ofendido tem a plena consciência
que está a ser subestimado, desconsiderado e injustiçado. É terrível.
O injusto, mais cedo ou mais tarde,
torna-se, irremediavelmente, cruel. É que ele tem mania de perseguição.
Acredita, piamente, que todo mundo quer ofendê-lo, cobrá-lo e prejudicá-lo.
Desconfiado, pensa que todas as pessoas são mal intencionadas, e, dessa forma,
não mede conseqüências quando utiliza as palavras e efetiva as ações, e por
isso causa dor às pessoas, sentimento de insatisfação e até mesmo de revolta.
Quando um pai ou uma mãe; um juiz ou um
presidente; um policial ou um professor ou qualquer cidadão cometem injustiças
termina a paz e começa a guerra. Sem justiça não há paz. Sem justiça não há
diálogo e nem perdão. O Injusto torna normal o que é pecado; não sente culpa
pela injustiça — o pecado cometido. Esta conduta é tão natural e intrínseca ao
seu caráter, que de tanto cometer o mesmo pecado, nunca se arrepende, pois
considera o que fez ou o que pensa fazer absolutamente normal.
O injusto é a iniquidade em pessoa, a
ferocidade como sua voz e a perversidade como essência de sua ação social e
moral. A ferramenta do injusto é a injustiça — a mãe da discórdia, da vilania,
do sofrimento, e, consequentemente, da ausência de paz. É isso aí.
Fonte:
brasil247.com.br - Texto de Davis Sena Filho