quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Plano de baratear a energia passa pela primeira barreira


Apesar da gritaria dos primeiros dias, foi quase que total a adesão das empresas de energia elétrica à renovação dos contratos de concessão dentro das novas regras traçadas pelo governo na Medida Provisória nº 579, publicada no início de setembro. Para renovar as concessões por até 30 anos, as empresas de geração, transmissão e distribuição de energia cujos contratos vencem entre 2015 e 2017 têm que aceitar uma redução ainda não conhecida oficialmente do preço cobrado por seus serviços. Mas estima-se que as tarifas hoje praticadas podem ser cortadas em até 70%.
Com isso, o governo pretende baratear a conta de luz para as famílias e empresas. A promessa, anunciada pela própria presidente Dilma Rousseff, é reduzir o preço da energia em média em 20,2%, a partir de 5 de fevereiro. Os consumidores residenciais farão uma economia média de 16,2%, e as empresas, de até 28%, com inegável impacto positivo na inflação.
Para chegar a essa redução, o governo abriu mão de vetustos encargos setoriais, a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) e a Reserva Geral de Reversão (RGR). Já a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) será reduzida a 25% do valor atual, assumirá o custeio de programas contidos nas outras duas e receberá um aporte de R$ 3,3 bilhões anuais do Tesouro. Mesmo assim, o governo prevê déficit de pelo menos R$ 1,3 bilhão em 2013.
Com essa manipulação tributária, o governo estima que contribuirá com 7 pontos percentuais da redução de 20,2% das contas de luz; os 13,2 pontos restantes virão da derrubada das tarifas das concessionárias de R$ 90 a R$ 100 para R$ 30 por megawatt-hora (MWh). O corte das tarifas pressupõe que as empresas já amortizaram seus inegáveis pesados investimentos ao longo de décadas de concessão. Nem todas as empresas concordam com isso e a conta final depende muito da idade de cada operação. O governo deve indenizar empresas cujas instalações ainda não foram amortizadas. Mas esse é outro ponto ainda obscuro na nova regra.
Fazem parte do universo das empresas afetadas pelas novas regras 123 geradoras de energia, que somam capacidade instalada de 20 mil megawatts (MW), equivalente a 20% do parque gerador brasileiro, com contratos que vencem entre 2015 e 2017; 44 distribuidoras que dominam 35% do mercado consumidor e têm contratos a expirar entre 2015 a 2016; e nove transmissoras, donas de 85 mil quilômetros de linhas, ou 67% da rede do Sistema Interligado Nacional, até 2015.
Essas empresas tinham até segunda-feira para pedir a renovação das concessões. Os contratos deverão ser assinados até 4 de dezembro. Nesse período, a Aneel vai elaborar as minutas dos contratos e espera-se que sejam esclarecidos os pontos ainda obscuros, como os valores da nova tarifa e das indenizações, pontos importantes na decisão das empresas.
O governo jogou pesado e conseguiu 92% de adesão, apesar do desconforto das empresas com as indefinições. Era praticamente obrigatório que as concessionárias manifestassem interesse por seus negócios e isso não significa que todas assinarão o contrato final. Aderiram todas as 44 empresas de distribuição, as nove transmissoras e 109 das 123 usinas de geração. Apenas 14 geradoras ficaram de fora. Nessa conta estão pelo menos duas hidrelétricas inativas da Energisa, que não funcionavam desde janeiro de 2011, quando foram danificadas pela enchente que assolou a região serrana do Rio de Janeiro. Mas também estão três operações importantes da Cemig, as usinas de Jaguara, São Simão e Miranda, que representam cerca de um terço da capacidade instalada da estatal mineira.
A Cemig solicitou a renovação de outras 18 usinas, mas acredita que as três que ficaram de fora têm direito a ter a concessão prorrogada por mais 20 anos nas condições vigentes antes da MP 579. Em uma situação semelhante, a Cesp agiu diferente e pediu a renovação da concessão da usina Três Irmãos, no rio Tietê, esperando negociar posteriormente a renovação pelas regras anteriores. 
O governo começou a discutir a renovação dessas concessões bastante importantes no parque gerador de energia do país há pelo menos quatro anos, no âmbito de um grupo de trabalho de alto nível. É incrível que depois de tanto tempo ainda existam pontos obscuros e questões indefinidas que abrem espaço para questionamentos jurídicos e geram insegurança em relação à taxa de retorno dos produtores e dos custos dos consumidores, com repercussões negativas em outros ambiciosos e importantes projetos de investimento em infraestrutura do país.

Por Francisco Nixon Frota - Valor Econômico
Fonte: Blog do Nassif