quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Mais próximos do abismo

O Premio Nobel de Economia Paul Krugman encerrou uma das últimas notas de seu blogue com a palavra “deprimente.”

Krugman se referia ao comportamento de economistas que, nos dois lados do Atlantico, inundaram os meios políticos e financeiros com análises erradas sobre a origem da crise econômica e, em consequencia, ofereceram saídas também erradas para resolver o problema.

Krugman está convencido de que muitos economistas agiram assim para preservar o próprio ego – e também por conveniencia política.

É possível ter uma idéia desses erros pelo comportamento dos mercados nos últimos dias. As bolsas despencam, as empresas perdem valor e bancos de grande porte são rebaixados, gerando um ambiente de novas e maiores incertezas. Meses atrás, contudo, os executivos do Banco Central Europeu eram parabenizados pelo rigor na exigencia de medidas de austeridade por parte dos países em dificuldade.

Muitos economistas ficaram de cabelos em pé diante do colapso do mercado em 2008 mas passaram os dois anos seguintes tentando dar a impressão de que tudo voltaria a ser como era antes do desmanche do Lehman Brothers. O saldo foi um desastre, nos Estados Unidos, e uma tragédia, na Europa.

Verdade que as respostas foram diferentes, nos dois casos. Mas, de uma forma ou de outra, americanos e europeus apostaram na boa vontade dos mercados para resolver o problema.

A questão, nos dois lados do Atlantico, era a mesma — falta de demanda. E isso ninguém soube encaminhar. Pois seus analistas diziam que era preciso controlar o déficit dos governos e evitar gastos exagerados — o que só era verdade, matematicamente, no caso da economia grega.

Como Krugman, o também Premio Nobel Joseph Stiglitz e outros economistas não se cansaram de explicar, esta era uma prioridade capaz de agradar aos meios políticos conservadores e ao velho sistema financeiro. Permitia retornar ao mundo ideológico anterior a 2008 — mas não podia dar certo. Como todos irão se recordar, aqueles bonus milionários e indecentes voltaram a ser pagos para os felizardos que comandam grandes instituições.

O problema é que sem dinheiro no bolso, as famílias não compram. Se não compram, o consumo cai, a produção diminui e o desemprego aumenta. As empresas produtivas entram em dificuldade e não podem pagar seus credores. As contas do governo pioram, porque as receitas caem. O sistema financeiro balança e o céu pode cair sobre nossas cabeças. É isso que está acontecendo agora.

Num editorial recente, a Economist, insuspeita de qualquer preferencia intervencionista, conclamou os governos da Europa a fazer um pacto para salvar a economia do Velho Mundo e impedir que um colapso continental possa levar o planeta inteiro para o abismo. Outros economistas influentes, capazes de manter o bom senso numa hora de grande tensão, recomendam o mesmo remédio.

É deprimente, como escreveu Paul Krugman, constatar que não são idéias originais mas estavam na mesa há mais de um ano, quando se considerou que a melhor receita para enfrentar a crise da Grécia era cortar investimentos, diminuir o emprego e aumentar a pobreza, obrigando aquele país a devolver aos bancos, centavo por centavo, aqueles emprestimos que havia obtido quando o crédito barato produzia ilusões nos dois lados do balcão.

A Economist sustenta que, com disposição política, em poucos dias seria possível promover mudanças dramáticas na Europa, em regime de urgencia. Mas o problema é esse: disposição política. A economia mundial é dirigida por instituições e executivos habituados a concentrar lucros e socializar prejuízos. Estas instituições mantém uma clientela política a seu serviço, com um comportamento servil que, no caso americano, chega ao limite do grotesco com a facção do Tea Party.

Nesta situação, eles tem horror a assumir suas responsabilidades e a oferecer sua própria cota de sacrifício. Não seria possível estimular o crescimento sem reescalonar dívidas e isso representa uma queda nos lucros das instituições credoras. Também seria preciso colocar dinheiro nos bolsos vazios, pois é preciso que voltem às compras para a economia voltar a funcionar. Mas como fazer isso depois de jogar a culpa pela crise nas costas dos países pobres?

Está claro que se perdeu muito tempo acreditando em opções previsivelmente erradas. Em função disso, prejuízos e dificuldades tornaram-se desnecessariamente maiores. Boas idéias parecem não dar certo porque ninguém consegue acreditar nelas, como escreveu Vinícius Freire, na Folha, para explicar o efeito nulo das últimas medidas do Federal Reserve para reanimar a economia americana.

Mas parece claro que não há mais tempo a perder. O problema é saber quem será capaz de aproveitá-lo. Este é o drama no momento.