quarta-feira, 1 de junho de 2011

Espanha - "Mundo", uma volta à direita?


O resultado das eleições foi um completo desastre para o PSOE. A votação socialista experimentou uma queda abrupta em suas duas bases mais poderosas de norte a sul do país.

Os pessimistas de plantão dirão que as eleições espanholas indicam uma “virada à direita”. Eles vão lamentar o “baixo nível de consciência das massas”. Essas pessoas estão sempre prontas a culpar a classe trabalhadora por sua própria impotência. Elas entendem menos que nada dos processos reais que ocorrem na sociedade.

A verdade é que os resultados das eleições eram totalmente previsíveis. As políticas do reformismo não podem sobreviver à crise do capitalismo. A burguesia estala os dedos e os socialdemocratas saltam imediatamente para atendê-la. Na pressa para salvar o sistema, eles esquecem tudo sobre reformas e passam às contrarreformas.

Reformismo com reformas reais até faz sentido para os trabalhadores. Mas reformismo sem reformas – reformismo com contrarreformas, cortes e austeridade, não faz nenhum sentido. Isto causa frustração e desilusão entre os trabalhadores, que punem o governo retendo seus votos. Tal fato também tem a vantagem adicional de desacreditar a idéia de “socialismo” aos olhos da classe média.

Temos salientado várias vezes que a situação atual será caracterizada por acentuadas oscilações da opinião pública, tanto para a esquerda quanto para a direita. Quando os socialdemocratas se encontram no poder, a oposição de direita acusa aos “socialistas” pela queda dos níveis de vida, pelo aumento dos preços e dos impostos e pelo desemprego. A direita argumenta demagogicamente: “Vocês estão vendo o que estes vermelhos fizeram? Deixaram o país de joelhos”.

Os trabalhadores da Espanha deram um voto esmagador de censura a um governo que segue o programa dos banqueiros e dos capitalistas. Contudo, isto não pode ser caracterizado como uma vitória da direita. Embora o conservador PP tenha obtido a vitória nas eleições municipais e regionais ontem, praticamente não aumentou sua votação – apenas dois pontos a mais do que em 2007. Estas eleições não foram ganhas pelo PP, mas perdidas pelo PSOE, cuja votação caiu em 4,5 milhões.

A direita utiliza-se do descontentamento da classe média para suscitar o sentimento reacionário sobre a imigração, o terrorismo e outras questões. Isto explica o aumento dos votos ao PP. A surpresa não é que tenha aumentado sua votação. Em Madri, onde o PP se encontra no poder há anos, sua votação verdadeiramente afundou.

O resultado foi decidido pelos milhões que não votaram ou votaram “em branco”: os trabalhadores e jovens que se sentiram traídos pelo governo de Zapatero e que ficaram em casa – ou foram para a Puerta del Sol. Os “indignados e indecisos” refletiram o sentimento geral de descontentamento com os partidos e as instituições existentes.

Em Euskadi [País Basco, no norte da Espanha], Bildu, a frente eleitoral da esquerda radical basca, obteve um forte resultado e deslocou o PSOE para o segundo lugar, conseguindo o primeiro lugar na província de Guipúscoa, e também conseguiu um resultado notável em Navarra. Os abertzales [frente nacionalista basca] são vistos por muitos como a alternativa mais radical e à esquerda das políticas reformistas do PSOE.

E agora?
Os resultados das eleições espanholas serão um choque para muitas pessoas, incluindo as pessoas que se encontram na Puerta del Sol. O movimento de rebelião nas ruas quase certamente irá morrer por um tempo.

O que os organizadores consideram ser o seu ponto forte – o seu caráter espontâneo – é também o seu ponto mais fraco. Para ir mais longe, ele necessita ser organizado e armado com um programa revolucionário e uma perspectiva científica.

Acima de tudo, ele necessita ser firmemente ligado ao movimento dos trabalhadores, a única força que pode proporcionar uma mudança fundamental na sociedade.

As eleições indicaram a rejeição massiva das políticas econômicas implementadas pelo governo socialista. José Luis Rodriguez Zapatero explicou que ele “pagou um preço muito alto” por essas políticas.

Mas um preço ainda mais alto foi pago por milhões de espanhóis que se encontram sem emprego. Na noite passada, ele descartou as eleições antecipadas e disse que vai “trabalhar para fortalecer a recuperação”. Isto significa mais do mesmo.

Esta é a receita pronta e acabada para a derrota nas eleições gerais de 2012. A manchete de hoje do jornal espanhol Publico é: “O PSOE colapsa como resultado de sua virada à direita”. E o subtítulo do jornal El Pais é: “O PSOE pavimenta o caminho para Rajoy ao Moncloa com uma derrota sem precedentes”. Esta avaliação está correta. Parece provável que o PP formará o próximo governo. Mas isto acontecerá em condições de profunda crise social e econômica.

São incertas as perspectivas para o conjunto da Europa. Depois da Grécia, da Irlanda e de Portugal, a Espanha está exposta como o elo fraco da corrente. O Fundo Monetário Internacional alertou que a crise da dívida da zona do euro pode se espalhar por toda a região, a menos que os países europeus intensifiquem os esforços para “corrigir seus bancos”.

Em sua mais recente perspectiva econômica para a Europa, o FMI disse que a crise da dívida na Grécia, em Portugal e na Irlanda poderia afetar toda a zona euro produzindo uma crise de confiança, apesar dos “pacotes de resgate” que já estão em vigor:
“As ligações financeiras entre os países com problemas de dívida soberana e o restante da Europa poderiam representar mais riscos para as perspectivas”, disse o FMI, na quinta-feira. “Restaurar a saúde fiscal, abordar diretamente os bancos fracos e realizar as reformas estruturais para restaurar a competitividade são essenciais”.

Em português claro isto significa: devem-se derramar mais bilhões nos bancos e financiar tudo isto cortando o “desperdício de gastos públicos” em coisas hospitais, escolas e aposentadorias. O PSOE tentou evitar isto, mas finalmente foi forçado a realizar os ditames do grande capital. Mas um governo do PP vai realizar essas políticas com entusiasmo desde o primeiro momento.

A demagogia do PP em breve ficará exposta enquanto a crise da economia espanhola vai de mal a pior. A classe média logo descobrirá que sua situação se encontrará ainda pior com o PP do que esteve com os socialistas. A agitação da juventude se intensificará. E os trabalhadores que estavam relutantes em confrontar o governo do PSOE não terão escrúpulos de consciência sobre lutar contra o PP.

Os mais perspicazes representantes do Capital olham para o futuro com maus pressentimentos. Na Espanha, a classe dominante está pressionando para Zapatero permanecer no poder. Ela percebe que um governo do PP irá levar a um confronto aberto entre as classes que ela está ansiosa por adiar, enquanto espreme Zapatero como a um limão. Contudo, a liderança do PP está ávida pelo poder e pressiona por eleições antecipadas.

Cinco Dias, o diário dos capitalistas espanhóis, alertou ao PP para não se aproveitar de sua vitória nas eleições locais para revelar as dívidas podres dos conselhos locais, com receio de causar pânico nos mercados monetários.

A perspectiva é de uma intensificação da luta de classes. Hans Jörg Sinn, um dos principais analistas econômicos da burguesia na Alemanha, está advertindo sobre uma guerra civil na Grécia. O mesmo pode ser verdadeiro na Espanha e em outros países do sul da Europa. Através da experiência amarga os trabalhadores redescobrirão as tradições revolucionárias do passado.

O movimento nas ruas da Espanha durante a última semana é apenas um ensaio para ainda mais dramáticos acontecimentos que irão transformar toda a situação.

Parte do texto Na Espanha, insatisfação ecoa nas eleições - As eleições espanholas e o movimento revolucionário. Por Alan Woods, do site Esquerda Marxista
Fonte: http://www.rodrigovianna.com.br