Cá na província, de agora até a quarta-feira de cinzas tudo é carnaval – e se fundem prévias de troças, blocos e agremiações diversas com balões de ensaio na política. E como papel aceita tudo, qualquer especulação pode virar notícia.
Assim, como gato escaldado que tem medo de água fria, leio a notícia veiculada na Folha de S. Paulo da última quarta-feira, 5, que dá conta de entendimentos entre o PMDB e o DEM com vistas a alianças nos pleitos municipais de outubro como uma espécie antessala de uma hipotética fusão futura entre os dois partidos. Com o olhar benevolente do Planalto. O próprio vice-presidente da República, Michel Temer, estaria no comando das tratativas.
Alianças diversificadas e muitas delas surpreendentes costumam acontecer em eleições para prefeito e vereador pelo país afora. No âmbito municipal a política é furta cor: legendas aliadas em plano estadual ou federal disputam entre si o poder local, assim como se formam coligações dentre as que se digladiam. Isto reflete a complexidade da sociedade brasileira e o grau ainda insatisfatório de construção da maioria dos partidos políticos. Não há necessariamente uma coerência verticalizada no comportamento dos partidos.
Por esse ângulo, nada a estranhar na notícia da Folha. Mas chama a atenção que um dos focos das conversações seja exatamente a capital de São Paulo; e se cogite de uma futura fusão entre o partido do vice-presidente e o partido da barulhenta bancada da extrema direita. Ou, dito de modo mais preciso, a absorção do DEM pelo PMDB.
O pano de fundo dessa especulação é algo maior do que o visível raquitismo do DEM; está na fragilidade da oposição como um todo. Sem rumo, sem discurso, sem proposições alternativas à orientação adotada pelo governo federal os partidos oposicionistas quase que se limitam a replicar o que se publica na grande mídia, esta sim convertida em força organizada de combate ao governo. De tal sorte que o trio PSDB, DEM e PPS, abatido em anemia crônica, tende a se enfraquecer mais ainda.
Bom ou ruim? À primeira vista a absorção do DEM poderia favorecer o governo da presidenta Dilma, premiada com o alargamento de sua base de sustentação parlamentar. Mas nem tanto, pois reforçaria o setor mais conservador dessa base, em desvantagem para o segmento mais avançado da coalizão governista.
Numa visão mais de longo prazo, melhor seria que houvesse uma oposição partidária programática capaz de alimentar a polêmica acerca dos rumos da Nação, incluindo o diretista DEM. Daria cor e consistência ao debate democrático e contribuiria (pelo confronto de ideias) para a formação de uma consciência social avançada, fator indispensável para a transformação da sociedade.
Fonte: brasil247 por Luciano Siqueira (membro do Comitê Central do PCdoB, deputado estadual em Pernambuco)