O texto abaixo é um dos achados do projeto Mega – Marx-Engels GesamtAusgabe, que, a partir dos arquivos de Karl Marx, está organizando a sua imensa obra ainda inédita: 114 volumes, o último dos quais será publicado em 2020.
Para entender em que mundo vivemos e viveremos, este artigo jamais lido do Capital, parece ter sido escrito hoje.
Eis o texto.
A enorme quantidade e variedade de mercadorias disponíveis no mercado não dependem apenas da quantidade e da variedade de produtos, mas são, em parte, determinadas pela entidade da parte de produtos produzidos como mercadorias, que deverão, portanto, ser inseridos no mercado para a venda na qualidade de mercadorias.
A grandeza dessa parte das mercadorias vai depender, por sua vez, do grau de desenvolvimento do modo de produção capitalista que produz os seus próprios produtos apenas como mercadorias, e do grau em que tal modo de produção domina em todas as esferas da produção.
Deriva daí um grande desequilíbrio no intercâmbio entre países capitalistas desenvolvidos, como aInglaterra, por exemplo, e países como a Índia ou a China. Esse desequilíbrio é uma das causas da crise.
Causa totalmente negligenciada pelos burros que se contentam em estudar a fase do intercâmbio de um produto por outro produto e que esquecem que o produto não é, portanto, em caso algum, mercadoria intercambiável enquanto tal. Isso constitui também a pedra no sapato que leva os ingleses, dentre outros, a querer subverter o modo de produção tradicional existente na China, na Índia etc., para transformá-lo em uma produção de mercadorias e, em particular, em uma produção baseada na divisão internacional do trabalho (ou seja, na forma de produção capitalista).
Eles conseguem, em parte, esse intento, por exemplo, quando prejudicam os fiadores de lã ou de algodão vendendo seus produtos a um preço inferior ou arruinar o seu modo de produção tradicional, que não é capaz de competir com o modo de produção capitalista ou com o modo capitalista de inserir as mercadorias no mercado.
Embora o capital produtivo, por sua própria natureza, esteja disponível no mercado, isto é, oferecido à venda, o capitalista pode (por um período de tempo longo ou curto, de acordo com a natureza das mercadorias) mantê-lo longe do mercado se as condições não lhe forem favoráveis ou com o fim de especular, ou outro.
O capitalista pode subtrair o capital produtivo do mercado das mercadorias, mas, em um momento posterior, será obrigado a reinseri-lo. Isso não tem efeitos sobre a definição do conceito, mas é importante para a observação da concorrência.
A esfera da circulação das mercadorias, o mercado, é, enquanto tal, diferente também fisicamente da esfera da produção, exatamente como são diferentes temporalmente o processo de circulação e o efetivo processo de produção. As mercadorias agora prontas ficam depositadas nos armazéns e nos depósitos dos capitalistas que as produziram (exceto no caso de serem vendidas diretamente), quase sempre só de modo passageiro, antes de serem expedidas para outros mercados.
Para as mercadorias, trata-se de uma estação de preparação a partir da qual serão inseridas na efetiva esfera de circulação, exatamente como os fatores da produção disponíveis permanecem à espera, em uma fase preparatória, antes de serem transportados para o efetivo processo de produção.
A distância física entre os mercados (considerados do ponto de vista da sua localização) e o lugar do processo de produção das mercadorias dentro de um mesmo país, e sucessivamente fora dele, constitui um elemento importante, porque é justamente a produção capitalista que faz com que, para uma boa parte dos seus produtos, o mercado seja constituído pelo mercado mundial. (As mercadorias também podem ser adquiridas para serem retiradas imediatamente do mercado, mas esse elemento deveria ser examinado em outros lugares, assim como a menção anterior às mercadorias que os produtores mantêm longe do mercado).
Consequentemente, é preciso que o mercado se expanda continuamente. Além disso, em todas as esferas individuais da produção, todo capitalista produz de acordo com o capital que lhe é oferecido, independentemente do que fizerem os outros capitalistas. No entanto, não será o seu produto, mas sim o produto total do capital investido nessa particular esfera de produção que irá constituir o capital produtivo, que oferece à venda esta e qualquer outra esfera individual de produção.
É um dado empírico que, embora a dilatação da produção capitalista leve a um incremento, a uma multiplicação do número de esferas de produção, ou seja, de esferas de investimento do capital, nos países de produção capitalista avançada, essa variação jamais mantêm o mesmo ritmo que o acúmulo do próprio capital.
O texto foi publicado no jornal La Repubblica, 08-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fonte: blog do Nassif - Do IHU Online